domingo, 11 de dezembro de 2011

A foto de Dilma (por Moisés Mendes)*

Dilma: "Sabe por que gosto daquela foto?
Porque ela é verdadeira. Foi o que aconteceu."
        Enquanto alguém fotografava Dilma Rousseff naquele interrogatório da Auditoria Militar do Rio, você fazia o quê? Você que era jovem, com idade para duelar com a ditadura e cometer loucuras em nome da democracia ou de uma revolução, o que você fazia naquele novembro de 1970 enquanto Dilma encarava os militares com o nariz empinado e você nem sabia que Dilma existia?
       Admita: você, seus irmãos, seus colegas, seus vizinhos não faziam quase nada. Eu confesso: tinha 17 anos, dormia escutando as baladas da Rádio El Mundo de Buenos Aires e acordava pensando no milagre que eliminaria minhas espinhas da cara. Como nos empurraram para a alienação naquele 1970, em Alegrete ou em Porto Alegre!
       E agora você, que tem hoje a idade de Dilma em 1970, que tem 22 aninhos, que já postou mais de mil fotos suas no Facebook: você já tem uma foto síntese como aquela de Dilma? Tem a imagem que revele sua alma, que dispense legendas, que esteja para você como a Mona Lisa está para todas as mulheres e como a Guernica de Picasso está para todas as guerras? Você tem uma imagem que tenha condensado tudo de você?
       Se ainda não produziu a foto reveladora de sua presença neste mundo, não se penitencie. A foto de Dilma é única. Não acredite na conversa de que todos os jovens daquele 1970 enfrentavam a ditadura com o olhar de laser de Dilma. Os jovens de 1970 estavam anestesiados por quatro anos de regime militar, pelo Tri no México, pela censura.
       A edição número 115 da Veja, de 18 de novembro daquele 1970, trazia esta capa: Em quem os jovens votaram. A repotagem tratava de uma pesquisa com mil jovens de 18 a 22 anos, de São Paulo, Rio, Porto Alegre e Recife, que votaram pela primeira vez no dia 15  daquele mês para eleger senadores e deputados.
       Algumas revelações da pesquisa: 52% não sabiam por que os militares fizeram o golpe de 64; outros 25% disseram que o golpe evitara o comunismo; 71% achavam que o povo estava feliz com a situação do país; 51% dos jovens gaúchos votariam na Arena (o partido do governo) e 44% no MDB (da oposição); e 55% de todos os pesquisados no país votaram "por obrigação" (só 10% entendiam que votar era um direito). E quem tinha sido Oswaldo Aranha? 83% não tinha a menor noção. E qual seria a nota para o presidente Médici? Um 8,4. E assim por diante.
       Na eleição, de 70, o MDB levou uma lambada de dois votos por um da Arena. A Arena elegeu 41 senadores e 223 deputados federais. O MDB, apenas seis senadores e 87 deputados. No estado, Daniel Krieger e Tarso Dutra, arenistas, foram eleitos senadores com o dobro de votos dos emedebistas Paulo Brossard e Geraldo Brochado da Rocha.
       Foi uma goleada do partido do governo, com o voto faceiro dos jovens. Vão dizer que havia a campanha do voto nulo, que o país ainda estava confuso, que faltava coesão ao MDB, aos democratas e às esquerdas. Nessa confusão, os jovens eram, como escreveu Mino Carta, o diretor de Veja, "pouco politizados, muito práticos e eventualmente ingênuos".
       Éramos alienados, seu Mino. Jovens com o perfil de Dilma, comunistas, democratas ou anarquistas, que provocaram o confronto do regime com suas próprias vergonhas, eram quase todos da minoria da militância estudantil. Só leve a sério quem aparecer contando vantagem, com histórias de resistência e bravura naquele 1970, se conhecer sua trajetória.
       A foto de Dilma no interrogatório não é a síntese da juventude brasileira de quatro décadas atrás. É apenas a foto de uma moça destemida diante de dois homens torturados pela desonra.

*Jornalista da Zero Hora, na qual este artigo foi publicado (edição deste domingo, 11 de dezembro).

12 comentários:

  1. Aldyr, esta foto está no livro "A vida quer coragem" do jornalista Ricardo Amaral, homônimo do farrista carioca, lançado nesta primeira quinzena de dezembro.
    Esta foto jamais tinha sido publicada, pelo menos nunca a vi, o olhar da Dilma é um misto de altivez de quem tem coragem e de desamparo dos torturados à mercê da gorilada sádica.


    Angelo

    ResponderExcluir
  2. Mesmo assim, não gosto desta @#$%@ ela não faz nada pelo brasil, seu partido fez privatizar o local aonde meus parentes trabalhavam, esta tentando separar o Pará, tirou o Pré sal do Espirito Santo, Colocou nome no que já existia, como bolsa familia, escola,
    agora invetaram o bolsa gaz, bolsa puta...etc...
    Tiraram a divida com a bolivia fazendo a gasolina aumentar mais de 40%
    aumentaram os juros para produtos importados,
    retiraram o Ibama do poder sobre as florestras e matas
    querem cronstruir um uzina eletrica para gerar energia e matar indios, matas, etc....

    Agora voce vir me falar que a dilma e so seu @#$@% do PT é otimo,
    Vamos acordar para Cuspir né!!
    Estou nem ai para o que ela fez no passado, alem do mais alguma hora a ditadura iria acabar, estou preocupado com o hoje, quem vive de passado é museu...

    ResponderExcluir
  3. "O problema da jovem Dilma no tribunal é o photoshop na história, não na fotografia. Ou: quem mostra e quem cobre a cara."

    Leia mais em:
    http://veja.abril.com.br/blog/reinaldo/geral/o-problema-da-jovem-dilma-no-tribunal-e-o-photoshop-na-historia-nao-na-fotografia-ou-quem-mostra-e-quem-cobre-a-cara/

    ResponderExcluir
  4. Meu pesadelo começa em 64.Perda de amigos nas prisões, perda de amigos pq era ruim andar comigo.
    Nos anos 70, veio a dificuldade de conseguir emprego.Faltava-me o atestado ideológico que " alguém " que não se sabia quem fornecia.Recordo sempre a dotr de quem saiu e o medo de quem ficou - esses pesadelos ainda retornam.Pesadelos mesmo, basta eu ter febre ou sede.
    Lindo texto.Comovente e verdadeiro.

    ResponderExcluir
  5. Realmente ela até hoje tem se mostrado que não é muito chegada a ordem e a disciplina... O que seria dos brasileiros, de hoje, se não fosse a Revista Veja e a Rede Globo... Quem lutou contra uma didatura, defendendo o nosso Brasil a unhas e dentes, não poderia ser tão tolerante como está sendo diante de tanta impunidade e ditadura do mau feito!!! @eufalosim

    ResponderExcluir
  6. "... alguma hora a ditadura ia acabar". O problema é que o texto que o BF publicou foi escrito para ser lido por quem não é analfabeto funcional!

    ResponderExcluir
  7. A presidenta Filma é e sempre foi uma mulher corajosa, calorosa e integra, visto a forma como tem conduzido com tanta garra este Brasil. muitas vezes criticada pela queda de seus ministros, quando deveria ser elogiada pela forma ética e honesta de governar, não aceita pessoas comprovadamente não dignos a fazer parte de seu governo. Não gosto do PT de Dilma, mas admiro muito a Dilma do PT!!! Não votaria no Pt, mas votei na Dilma e me sinto tonelada de te-lá como representante do país.

    ResponderExcluir
  8. Como diz o velho dito popular: "Nem Cristo agradou a todos" não será Dilma a primeira...
    Admiro essa mulher pela coragem que falta a muitos de nós, pela perspicácia e honra ímpar.

    ResponderExcluir
  9. Parabéns pelo texto. Penso que os críticos da Presidente Dilma não tem moral nenhuma para comentar ou fazer ilações sobre as atividades revolucionárias dela. Se querem falar mal, que procurem em outra parte da biografia dela, pois a coragem que ela teve de largar uma vida de moça burguesa, para se enfilerar com aqueles que lutaram contra a Ditadura, lhe dá os predicativos necessários para ela estufar o peito e dizer: eu estava lá e fiz a minha parte.

    ResponderExcluir
  10. Um dia as ditaduras acabam, sim, Aldyr, sempre acabam as tiranias.
    O problema é o quanto custa para as pessoas enquanto esse dia não chega: em sofrimento, em desesperança, em vidas...
    E quem vive de passado não é museu, não, quem vive de passado é gente.
    Para o museu da história, para o museu da vida, vão aqueles que são impedidos de seguir vivendo; inclusive pela tortura, pela morte, pelas ditaduras...
    Belo texto, bela foto, bela história tem a nossa Presidente(a).
    Que ela saiba prosseguir fazendo história nestes tempos difíceis onde impera a ditadura do "analfabetismo histórico".
    Abraço,
    Pedro.

    ResponderExcluir
  11. Parabens pelo texto. Pena que a gente na época desconhecia os fatos políticos. As escolas não informavam. Evitam-se as discussões políticas. Elas eram proibidas na Escola Normal que cursei em sede de internato, dirigida por freiras católicas. Para ilustrar a nossa condição de idiotia forçada, lembro-me sempore de uma noite o Dep. Temperani Pereira foi fazer-nos uma palestra. Estávamos todos muito atentos. Mas logo nos primeiros 20 minutos, a luz foi apagada e a palestra encerrada. O palestrante falava sobre a miséria do nordeste, a seca,a fome, etc.Não recebemos explicações. Todos fomos dormir e ninguém podia falar sobre o assunto. Mas eu nunca me esqueci desse episódio.Tenho a idade da nossa magnífica presidente. Hoje só me resta homenajeá-la.

    ResponderExcluir
  12. A ditadura faz parte da nossa história, tem que ser estudada, escancarada para que nunca mais volte a se ter uma nem aqui e nem em parte alguma: prisões de pessoas encapuzadas, pais que sairam do país e deixaram filhos na prisão, torturas e desaparecimentos. Vinte anos de atraso no ensino que era vigiado. Estamos vivendo 15 anos de neo-liberalismo com atraso no ensino também...

    ResponderExcluir