terça-feira, 29 de novembro de 2011

Intolerância máxima (por Cláudio Brito)*

       Não sou igual ao senhor Bolsonaro. Sua intolerância, se fosse minha também, me inspiraria a chamá-lo de retrógrado, preconceituoso, fascista ou neonazista. Não vou por aí. Compreendo que existem milhares de pessoas como o deputado que o Rio de Janeiro reelegeu várias vezes. Votam para premiar sua arrogância, seus excessos de linguagem e seu descompasso com o tempo. Votam como todos, projetando-se, votando em quem pensa e age como o eleitor. O que nos espanta , mas não pode atemorizar.
       À máxima intolerância de Jair Bolsonaro e seus seguidores, respondamos com a tolerância que sintoniza com a liberdade de expressão.
       Essas pessoas têm o direito de dizer o que bem entenderem. Melhor que digam. Assim, fora das tocas e do submundo em que vivem, dando-se a conhecer, serão responsabilizadas. É esse o sistema, ou deve ser.
       Diga o que quiser e pague pelos excessos.
       É proibido proibir. Arquem todos pelas consequências sobre o que fizerem ou disserem.
       O senhor Bolsonaro feriu o decoro parlamentar? Que o atentado ganhe a resposta de séria apuração e justo julgamento.
       Há quem esteja indignado porque o deputado "acusou" Dilma Rousseff de simpatia ou gosto pela homossexualidade. E desde quando dizer que alguém tem esta ou aquela tendência é uma acusação? Não existe acusação, pois não há crime algum em ser ou admitir-se homossexual. Só na cabeça vazia ou mal preenchida dos intolerantes.
       Quem não peca pela intolerância desaprova, não aceita e repele, mas não impede um intolerante de praticar seus disparates. Só não se põe a rir do que diz o intolerante porque, na verdade, o que cabe talvez seja chorar. De vergonha e de pena. Com a advertência e a atenção que impeçam o avanço de ideias que nos lembram os trogloditas. Por isso, tolerância é a oposição certa ao retrocesso que os "bolsonaristas" pretendem. Sermos tolerantes é o que nos autoriza a conhecer o que pensam verdadeiramente os que pregam democracia querendo o autoritarismo.
       O grave, significativo e preocupante no discurso de Bolsonaro é a sinalização de que há muitos como ele. Falem à vontade, expressem livremente os horrores de seus ideais, melhor assim. Ouvindo-os é que saberemos quem são e quantos são. Para combatê-los no campo da democracia e da liberdade. Tolerando-os, assegurando-lhes todos os direitos e prerrogativas, mas levando-os à responsabilização.
       Se eu fosse igual ao Bolsonaro - Deus me livre disso -, diria que ele é um retrógrado, preconceituoso, fascista ou neonazista. O que se estenderia aos que o elegeram. Não posso fazê-lo. Há muita gente que se enganou votando nele, tenho certeza. A generalização seria outro pecado. O que o Brasil precisa é saber muito bem quem é Bolsonaro. Para responsabilizá-lo e impedir que outros preconceituosos vinguem e triunfem.

*Artigo publicado na Zero Hora de ontem.

"O conflito do homofóbico é que a homossexualidade deve ser eliminada do planeta porque a homossexualidade lhe é tentadora, convidativa e perturbante."

Vivendo e aprendendo, hein, Dona Maria?!

Por que em português os dias da semana acabam em "feira"?
Boicote à mitologia romana começou no século 5 em Braga e dura até hoje.

       O Sol, a Lua e os deuses da mitologia romana (que batizaram os primeiros planetas descobertos: Saturno, Júpiter, Marte, Vênus e Mercúrio) são os homenageados nos dias da semana em quase todos os idiomas ocidentais. Na língua inglesa, os agraciados são deuses nórdicos - Tyu (irmão de Thor) em Tuesday, Odin em Wednesday, Thor em Thursday e Fraye em Friday. Os portugueses, no entanto, quebraram essa tradição.
       Roma chamava os dias de Solis dies (dia do Sol, domingo), Lunae dies (dia da Lua, segunda), Martis dies (dia de Marte, terça), Mercurii dies (dia de Mercúrio, quarta), Iovis dies (dia de Júpiter, quinta), Veneris dies (dia de Vênus, sexta) e Saturni dies (dia de Saturno, sábado). O imperador Constantino (272-337), cristão, mudou Solis dies para Dominica dies, o dia do Senhor. Em português, acabou virando "domingo". No século 5, Martinho de Dume, bispo de Braga (noroeste de Portugal), iniciou forte campanha para substituir os nomes pagãos dos dias por expressões da liturgia católica: feria secunda, tertia feria, quarta feria, quinta feria, sexta feria. Feria, em latim, significava "dia de festa", "dia de descanso". Mas seu sentido, por força do cristianismo, alterou-se para "dia sagrado". Assim, Portugal, depois de chamar os dias de domingo, lues, martes, mércoles, joves, vernes e sábado, passou a ser o único país do mundo a usar a forma canônica para os dias úteis, mantendo o "domingo" e criando "sábado" a partir de shabbat - o dia de repouso na tradição judaica. Martinho, que virou santo, também tentou mudar o nome dos planetas, mas isso ele não conseguiu.
       Apesar do nome em português, a segunda-feira é, para a International Organization for Standardization (ISO), o primeiro dia da semana.

       Este texto foi retirado da revista Aventuras na História (Abril, ed. 98), que se encontra nas bancas. A informação contida no seu último parágrafo me faz lembrar da vizinha cidade de Rio Grande, de marcante influência lusitana. Logo ali, depois do São Gonçalo - sempre ressaltava o Fernando Lessa Freitas (filho de portugueses, diga-se) - havia a tradicional "Esquina da Sorte", que ficava localizada no meio de uma quadra; a Quinta, que, na realidade, era a quarta estação da linha férrea entre Pelotas e Rio Grande; a Junção, onde os vagões dos trens eram separados; o Povo Novo, que, em verdade, é o povoado mais antigo da região... 

segunda-feira, 21 de novembro de 2011

Grandes quadrinhos III

ANGELI

  


*Essas geniais tirinhas foram copiadas da revista Histórias de Amor (Chiclete com Banana Especial, nº 23A - Ed. Circo - 1990)

Mondo cane

       Está na Internet a notícia de que foi preso na Flórida, Estados Unidos, um "falso médico" que, pelo equivalente a R$ 1.200,00, injetou uma mistura de cimento, cola e selante de pneu na bunda de uma "paciente" (a qual, em decorrência dessa "intervenção", veio a sofrer sérias complicações de saúde). O tal médico, Oneal Morris, já teria feito a mesma coisa em outras mulheres e nele próprio que, conforme se vê nas fotos abaixo, "tem formas femininas".
Foto: Reprodução de TV       Ouvido a respeito da acusação, Dr. Morris alegou inocência. Disse que só está interessado na difusão do kuduro.

domingo, 20 de novembro de 2011

Vereditos (por Cláudio Moreno)*

      Num restaurante da capital, os ocupantes da mesa ao lado, mais interessados na bebida que na comida, discutiam se filé a pé leva ou não leva acento de crase. Estão naquele "leva", "não leva", quando um deles me reconhece e me cumprimenta. "Pronto", pensei, "sobrou para mim". E não deu outra, porque lá veio a consulta: "Professor, aprendi com o senhor que filé à Osvaldo Aranha leva acento porque se subentende à moda, e estou aqui tendo um trabalhão para provar para eles que filé a pé não é a mesma coisa; se não tem moda, não tem crase. Qual é o seu veredito?". "Você está certo, certíssimo", respondi. "O filé a pé, assim como o filé a cavalo, não são pratos batizados em homenagem a alguma celebridade, como o filé à Chateaubriand. Meu ex-aluno comemora ruidosamente sua vitória moral, e já estou sentindo uma ponta de remorso por tê-lo subestimado em seu tempo de estudante quando ele, para tripudiar ainda mais sobre os amigos, acrescenta: "E filé a cebolado também não tem, não é?". Como dizia o Millôr, pano rápido!

- Garçom: o meu com bastante crase, por favor!

*Texto publicado no caderno Cultura, da Zero Hora de ontem.

quinta-feira, 17 de novembro de 2011

Photoshopagem alternativa

"Veja errou..."

      Sob o título "Refluxo gregoriano", em 18 de outubro postei: olhando para o chão/o homem reconheceu a própria cara/na do sapo entocado/em que recém escarrara. O "gregoriano" do título evidentemente fazia referência ao poeta Gregório de Mattos (o "Boca do Inferno"), a quem, erroneamente, atribuia a autoria dos célebres versos "O beijo, amigo, é a véspera do escarro/A mão que afaga é a mesma que apedreja". Na verdade, Gregório de Mattos nada tem a ver com isso, nem com beijo, nem com escarro (muito menos com sapo entocado!). Os versos que justificavam a citação são de outro poeta, Augusto dos Anjos - sequer contemporâneo dele.
       Ainda bem que não preciso fazer a prova do Enem! Aliás, os professores de Literatura reclamam que esse tipo de conhecimento não é cobrado no Enem.


Gregório de Mattos e Guerra nasceu em Salvador, na Bahia, em 1633. É considerado o primeiro de nossos poetas satíricos. Apelidado de "Boca do Inferno", tinha a "língua destravada" e "fácil veia poética". Estudou humanidades em Portugal, completando o Curso de Direito na Universidade de Coimbra. Chegou a exercer a magistratura em Portugal.  Por aqui, foi por algum tempo protegido do arcebispo da Bahia. Entretanto, devido a seu comportamento pouco ortodoxo, perdeu esse peneplácito, sendo degredado para Angola. Posteriormente, reabilitado, voltou ao Brasil, indo morar em Recife, onde morreu em 1696. Além de versos satíricos e humorísticos, escreveu poesias eróticas com grande incontinência verbal.  É o patrono da cadeira n.º 16 da Academia Brasileira de Letras.

A UM LIVREIRO QUE HAVIA COMIDO
UM CANTEIRO DE ALFACES COM VINAGRE

Levou um livreiro a dente
de alface todo um canteiro,
e comeu, sendo livreiro,
desencadernadamente.
Porém, eu digo que mente
a quem disso o quer taxar;
antes é para notar
que trabalhou como um mouro,
pois meter folhas no couro
também é encadernar.

Augusto de Carvalho Rodrigues dos Anjos nasceu no interior da Paraíba, em 1884. Desde muito cedo era tido por "doentio e nervoso". Formou-se na Faculdade de Direito do Recife (mas não chegou a exercer profissão ligada à área jurídica, ganhando a vida como professor de português e de geografia). Teve somente um livro publicado, "Eu", em 1912, que é considerado parnasianismo sob alguns aspectos e simbolista sob outros. Nele "canta a degenerescência da carne e os limites do humano". Morreu de pneumonia aos trinta anos de idade, em 1914. Ignorado na sua época, tornou-se, com o passar do tempo, um dos poetas de maior aceitação popular no país.

VERSOS ÍNTIMOS

Vês?! Ninguém assistiu ao formidável
Enterro de tua última quimera.
Somente a Ingratidão - essa pantera -
Foi tua companheira inseparável!

Acostuma-te à lama que te espera!
O Homem, que, nesta terra miserável,
Mora entre feras, sente inevitável
Necessidade de também ser fera.

Toma um fósforo. Acende teu cigarro!
O beijo, amigo, é a véspera do escarro, 
A mão que afaga é a mesma que apedreja.

Se a alguém causa inda pena a tua chaga,
Apedreja essa mão vil que te afaga,
Escarra nessa boca que te beija! 

*BF consultou "Roteiro Literário de Portugal e do Brasil - vol 2" (Ed. Civilização Brasileira, 1966), de Álvaro Lins e Aurélio Buarque de Hollanda,  para aplacar sua ignorância. A do responsável pelo blog, evidentemente. 

segunda-feira, 14 de novembro de 2011

Direto da eletrola


O disquinho, com Os Santos
       Apesar de ter sido campeão da Copa Governador do Estado em 1972, no ano seguinte o Grêmio Esportivo Brasil (por causa dos sérios problemas financeiros que atravessava) viu-se na contingência de "licenciar-se", deixando, assim, de participar das atividades oficiais da FGF durante dois (longos) anos.
       Voltou em 1975, numa divisão inferior (com Tino na zaga e Bino de centroavante!). O retorno xavante rendeu um samba, de autoria de José C. Braga, que, tempos depois, foi gravado pelOs Santos no lado B de um compacto simples de vinil (a raridade que ilustra esta postagem). Vale a pena ouvi-la no endereço  http://www.blogxavante.com/2011/10/07/audio-volta-xavante/, apreciando os doídos versos:

O recesso terminou
O Xavante voltou
Ô ô ô ô ô
A alegria do povo chegou

Os contrários me diziam
O teu time fechou
Mas agora eu respondo
Nosso Xavante voltou

O recesso terminou
O Xavante voltou
Ô ô ô ô ô
A alegria do povo chegou

O futebol da cidade
Estava acabado
Com a volta do Xavante
Ele foi ressuscitado

sábado, 12 de novembro de 2011

Cartas do Rio IV

       Ari:
       Nos últimos dias estive em Nova Friburgo. A cidade, em janeiro de 2010, foi terrivelmente afetada por uma tragédia que envolveu inundações, desabamentos de edifícios e deslizamentos de terra. A coisa foi realmente feia e resultou em centenas de mortes. As marcas de tal tragédia ainda podem ser constatadas por todos os lados. Ou seja, Nova Friburgo mostra-se como um triste exemplo da maneira irresponsável de construir cidades e de tratar a natureza. A população local está traumatizada e apreensiva. As chuvas de verão brevemente chegarão... Pouco foi feito e vários integrantes da administração municipal encontram-se afastados por desvio de recursos públicos. A coisa toda é muito triste!!!
       No entanto, durante a viagem Rio-Friburgo, para variar, o meu motorista perdeu o rumo, necessitando pedir informações. Paramos na frente de uma grande construção. Um hospital psiquiátrico. Na fachada estava escrito: “Somos loucos por você!”. Ao lado do simpático manicômio, havia uma padaria divertidamente chamada de “Miolo Mole”. Viva o bom humor! Viva o politicamente incorreto! Viva Nova Friburgo!
       Andrey

Em primeiro plano, o hotel onde fiquei
 

Até Urutu, Brutus?

       A Zero Hora propôs aos seus leitores que, através do endereço debates@zerohora.com.br, opinassem sobre "como podem ser evitados vazamentos, fraudes e erros nas provas do Enem?".
       Então, na semana passada, assinado-se "Luiz Franco, de Manaus", um velho conhecido deste BF, Ariovaldo Teixeira, respondeu: "É só dizer que o Enem é assunto de segurança nacional e colocar na pasta da Defesa. Os militares têm as melhores instituições de ensino do país, do Fundamental ao Superior e o MEC já provou que não consegue fazê-lo."
       Puxa vida, que saudades no Newton Cruz, do Leônidas Pires Gonçalves, do Otávio Medeiros e de gente da estirpe desses generais. Segurança Nacional é coisa séria, devendo ser tratada por gente que manja da "inteligência". Colocar o Enem na "pasta" deles é garantia de que a coisa vai funcionar, por certo.


A menos que tudo exploda antes do tempo! 

quarta-feira, 9 de novembro de 2011

O orfeão do Santa Margarida

       Houve uma época em que eu pensava assim: "estudei toda minha vida no Santa Margarida". Claro, a minha perspectiva era de quem tinha menos de duas décadas de existência. Então, os onze anos (da 1ª Série do Primário à 3ª do 2º Grau) em que estudei no colégio verde e branco da Anchieta eram, pelo menos, "a maior parte da minha vida".
       Foi lá que tive minha única experiência com a música. Não com o gosto por ouvir música, que eu nem tinha quando criança e adolescente. Mas a experiência de cantar (ou  tentar cantar). Foi no tempo que o colégio mantinha seu orfeão, ou seja, um grande coral, composto pelos alunos todos, dos mais novos aos mais velhos, sob o comando da inesquecível professora Eunice Lamego.
       Dona Eunice era uma figura pequeninha, frágil, mas que impunha respeito aos alunos que lotavam, duas vezes por semana, o auditório. Sob o comando dela aprendemos todos os hinos possíveis - do nacional, evidentemente, ao do Santa Margarida (que até hoje me arrepia e que começava com os versos "Aos acelos da glória e da alegria/a dominar os corações e a mente/percorremos a estrada que nos guia/a ciência e a verdade onipotente". Também cantávamos os hits ufanistas de então, como "Eu te amo, meu Brasil" e "Este é um país que vai para a frente" (estávamos em plena ditadura militar!), músicas do Roberto Carlos ("Debaixo dos caracóis dos seus cabelos" e "Jesus Cristo") e coisas do folclore ("Balaio", "Coco Peneruê). Ah, pelo menos uma gospel, em inglês, que falava da travessia do River of Jordan (!) e, por incrível que pareça, num colégio ligado à Igreja Anglicana, uma música que perguntava: "quem é esse cacique/glorioso e guerreiro/é Oxossi em seu cavalo/com seu chapéu de banda"... e lá iam as vozes da gurizada, uníssonas: "é de Aruanda-ê/é de Aruanda-á". Puro sincretismo!


Acima, nosso orfeão, numa pausa do ensaio.
Quase todos os que são identificáveis na fotografia pertenciam à quinta série do nosso saudoso Margarida.
O ano: 1971!
De frente, olhando para o "retratista": Maria Brasília (nasceu no dia da fundação da "nova" Capital Federal), Ivan Medeiros (nosso regente-mirim, que hoje se assina Iwan), Luciano Piltcher (envergando o uniforme da escola), Victor de Paula Palombo (tenho notícia de que virou militar) e um menino mais novo, cujo nome não lembro. Na segunda fileira: Fani Lewin (tem loja de produtos Hering na Osório), Lourdes Helena Pereló (era nossa vizinha; encontro de vez em quando, no súper), Ana Lúcia Guimarães (a filha do diretor, Rev. Eloí), Miriamar Barcelos (nunca mais vi), Marcel Power de Oliveira (é psicólogo, acho) e Dulce Rosane Timm (filha do Rudi, que trabalhava no colégio). Mais atrás, Walter Edemar Pottin (o CDF da turma), eu e Álvaro "Gordorréia" (já falecido). Bem no cantinho, à direita, a prima Claudia Schlee Gomes (que, como o Álvaro, não era da minha aula).

segunda-feira, 7 de novembro de 2011

Jaguar


Essa o BF foi buscar no fundo do baú: nA Vida Sexual do Jaguar (Ed. Codecri, 1979)

domingo, 6 de novembro de 2011

Jaguarense (por Andrey Schlee)


       A sensação que tenho é que ele sempre esteve ali. Ou eles... De um lado, um casarão com dez sacadas, e de outro, outro, mas com doze! Dois palacetes, dois edifícios singulares, dois clubes, muitas lembranças. Sobre cada porta central, na platibanda, uma estatueta. Simbólicas figuras femininas representativas do Harmonia e do Jaguarense. Clubes sociais e recreativos mantidos por estratos de uma mesma classe dominante em competição, por vezes, incessante. Separando os dois, um pavoroso hotel Sinuelo. Ligando os dois, um conjunto infinito de memórias...
       E é exatamente por isso que a sensação que tenho é que ele sempre esteve bem ali. Na tradicional esquina da Praça Alcides Marques com a rua Carlos Barbosa.
       No Jaguarense desfrutei de muitos bailes infantis. Vestindo “badeca” e camiseta listrada comprada nas Pernambucanas aproveitei cada momento burlesco. De bermuda, arrastava meus joelhos pretos no piso do salão principal. Como era divertido catar confetes! Algo psicodélico, piso geométrico desenhado pelo meu pai com confetes multicoloridos... Nas noites de carnaval, o programa era esperar o corso. Em torno da meia noite as rainhas chegavam, ou passavam. Carros alegóricos, as respectivas cortes, alguns mascarados e dois ou três bêbados (os cachorros fugiam com o estrondo dos foguetes!). Os adultos acompanhavam o desfile até os clubes e os bailes finalmente iniciavam. Os velhos e as crianças voltavam para casa. Certa vez, orgulhoso, vi passar um carro desenhado pelo pai. Era do Jaguarense, com uma rainha branca, uma choupana africana e dois grandes coqueiros. Segundo a Danda, era coisa de dar inveja ao carnaval carioca...
       No Jaguarense, frequentei pelo menos um memorável baile de debutantes – eu, o Carlos e a Cláudia (mas essa é outra estória). Um Clube onde o tio Tato não permitia beijos na boca!
       Também no Jaguarense participei de meu único campeonato de botão, jogando com todos aqueles craques, especialmente os baianos (o Dartanhã, o Jomar, o Hozaná, o Bury). O campeão foi outro baiano, mas com nome estranho: Moscovits. Foi também no Jaguarense que o Ari (Aldyr) mostrou que era bom mesmo! Sagrando-se campeão brasileiro de futebol de mesa em 1986(*). Por outro lado, o Cruzeiro do pai foi só uma bela promessa... E o Artigas nem decolou! Mas deixou saudades...
       Por tudo isso, e muito mais, quando o pai me mandou uma mensagem contando que o forro do Jaguarense havia desabado, eu não acreditei. Quando recebi um telefonema da Superintendente do IPHAN no Rio Grande do Sul, relatando a tragédia de Jaguarão, eu relutei em ouvi-la. Quando as primeiras fotos do Clube arruinado foram colocadas na minha mesa de trabalho, eu preferi não vê-las. Mas elas estavam ali.
       Como o Jaguarense sempre esteve lá. Repleto de memórias. Inclusive as minhas.
       Mãos à obra!!!!

*Na realidade o título referido no texto foi conquistado no Ginásio João Carlos Gastal, em Pelotas, em 1986.  

sábado, 5 de novembro de 2011

Clube Jaguarense - a queda

       O pai me disse, pelo telefone, que uma "coisa chata" tinha acontecido: o telhado do Jaguarense tinha desabado. Emocionado, chegou a comparar o  à própria decadência "da nossa família" (ancestralmente ligada a esse clube) em Jaguarão. Descoversei, tentei afastar, no breve diálogo telefônico, a procedência da comparação.
       Não imaginava, no entanto, a real dimensão do desastre (do prédio do clube, não da família).
       Então fui a Jaguarão e vi, com tristeza, o que sobrou do casarão do Jaguarense. A situação parece não ter volta: como se vê nas fotos abaixo, com a ruína do telhado, na parte do salão principal, nada sobrou além das paredes externas (porém estas acabaram se projetando para a frente, rachando praticamente de cima a baixo em ambos os lados da esquina). As estacas seguram-nas, para que não venham, também, ao chão.





       Lembro-me das vezes em que, pela mão do Tato (querido tio-avô) eu e meu irmão, crianças, íamos, faceiros, ao clube. Mas tarde, meados dos anos 70, foi naquele salão - hoje tomado por escombros - que disputei meus primeiros campeonatos importantes de futebol de mesa.     
       Acaso não seja possível salvar-se o centenário prédio do Jaguarense, é provável que no seu lugar venha a ser construído outro monstrengo como os que foram erguidos por Bancos em esquinas centrais da "Cidade Heróica" (e, à época, saudados como sinal de progresso).



       As fotos acima foram copiadas do blog confrariadospoetasdejaguarao.blogspot. Na da esquerda encontra-se retratado o prédio que deu lugar à horrenda agência do Banco do Brasil; já o palacete de dois andares, à direita, foi demolido para que, no seu terreno, fosse erguido o pavoroso prédio do Banrisul. Na frente deste último, onde havia o café (ponto de encontro diário dos cidadãos jaguarenses) - incendiado nos anos 70 -, surgiu a modernosa agência da Caixa Econômica Federal. Quem sabe não é o momento desses Bancos resgatarem a dívida que, por isso, têm com Jaguarão? 

quinta-feira, 3 de novembro de 2011

Ucho, ucho, ucho...

      Mais uma epopeia gaúcha!
      Domingo passado, no Estádio Olímpico, o Grêmio (9º colocado no Campeonato Brasileiro!) ganhou do Flamengo por 4x2. Ronaldinho, o "Gaúcho", foi estrepitosamente insultado durante toda a partida. A execução do Hino Nacional foi vaiada; depois, a plateia tricolor-bombachuda cantou efusivamente - mão no coração e lágrimas nos olhos - o Hino Riograndense.
       A propósito, bem se encaixa ao fato a charge do Iotti na ZH, sobre as comemorações da recente "Semana Farroupilha".

       Fico aqui imaginando: Ronaldinho nem deve ter dormido desde o fatídico fim-de-semana.