sexta-feira, 26 de agosto de 2011

Super-homens (por Kledir Ramil)*

Henrique da Costa
Mecking
"Mequinho"
       A primeira impressão que tive é que essa nova geração não conseguia se concentrar direito. Depois, fui me dando conta que eles desenvolveram uma capacidade de se concentrar em várias coisas ao mesmo tempo. Comparados a nós, são super-homens e super-mulheres.
       Quando eu era criança, o único de nós que conseguia tal proeza era o Mequinho, que jogava xadrez contra 20 adversários simultaneamente. Eu, um guri que tinha dificuldade de memorizar o movimento em L do meu próprio cavalo, ficava admirado com o brilho da mente do meu amigo que enfrentava 20 exércitos ao mesmo tempo e conseguia prever a próxima jogada de todas aquelas cavalarias e infantarias. Estudava todas as variáveis, imaginava cada lance possível e, no fim, derrotava todos.
       Henrique da Costa Mecking chegou a Mestre Internacional. Era meu vizinho em Pelotas e criamos uma amizade verdadeira que, mesmo a distância, se mantém até hoje. Chegou ao topo do ranking desse jogo que é considerado o supra sumo da capacidade mental. O que para mim, que acompanhava o boletim escolar dele, não foi nenhuma novidade.
       Até hoje, nas rodas mais intelectualizadas, costumo me gabar dizendo que aprendi a jogar xadrez com o Mequinho. O que não deixa de ser verdade, se considerarmos jogador de xadrez um sujeito que conseguiu aprender o movimento das peças no tabuleiro. Com exceção do L do cavalo.
       Em contrapartida, ensinei o Mequinho a dançar. O que posso dizer é que sou melhor enxadrista do que ele bailarino. Não tanto por meus feitos no tabuleiro, que são modestos. Mais pela dificuldade dele em transformar sua coordenação motora em algo que se possa chamar de dança. Aliás, um paradoxo que não tem muita explicação, pois um cara que é capaz de coordenar vários movimentos simultâneos de bispos, peões, torres e rainhas, deveria ter facilidade para dominar o balanço de seus próprios pés e quadril. Talvez eu tenha sido um mau professor.
       Voltando às crianças, a sensação que tenho é que temos uma geração de Mequinhos em várias áreas. Gente capaz de enfrentar adversidades múltiplas e variadas. E vencer todas. Tenho esperança nessa gurizada. Eles ainda vão fazer um mundo muito melhor do que esse que a gente conseguiu construir. Claro, tudo isso depois que passarem a fase da adolescência, que é a hora do recreio.

*Crônica publicada originalmente na Zero Hora de 22.8.11

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