domingo, 19 de junho de 2011

O Recorrente Delírio Classificatório (por Jorge Luis Borges)*

Este, beeem de longe,
parece uma mosca
Nas remotas páginas do "Empório Celestial de Conhecimentos Benévolos" - antiga enciclopédia Chinesa cujo modesto propósito é de encaixar todas as coisas do universo em categorias - é curioso observar, entre outras preciosidades, a seção dedicada à classificação dos animais. As categorias às quais eles podem pertencer são as seguintes:

a) pertencentes ao Imperador;
b) embalsamados;
c) amestrados;
d) leitões;
e) sereias;
f) fabulosos;
g) cães soltos;
h) incluídos nesta classificação;
i) que se agitam como loucos;
j) inumeráveis;
k) desenhados com um finíssimo pincel de pêlo de camelo;
l) etcétera;
m) que acabam de quebrar o vaso;
n) que, de longe, parecem moscas.

O etcétera parece ter sido incluído num momento de fastio do enciclopedista; a lista poderia muito bem terminar por aí, mas razões desconhecidas o levaram a acrescentar duas categorias circunstanciais. A utilidade desta classificação aparentemente se perdeu junto com o nome do autor; porém ela permanece como um divertido exercício de caos e prova que, nem sempre, o desaparecimento definitivo das culturas, das gentes e das tradições é prejudicial à humanidade.

*Extraído do conto O idioma analítico de John Wilkins, incluído no livro Outras inquisições (Companhia das Letras, 2007). Colaboração de Andrey Schlee, desde a NovaCap.

Um comentário:

  1. salve simpatia!!!!!!
    um "turbilhão de palmas" para os franco-germânicos...
    Kant e sua "maquina de classificação" e a "colagem" de Michel Foucault entre as palavras e as coisas.
    Quanto a dupla dinâmica, seria ela formada por Ortunho e Paraguaio????
    Grande abraço
    merenda

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