segunda-feira, 13 de maio de 2013

O Barcelona precisa vender o Messi (por Cristian Costa*)


Não conhece nada da história do Futbol Club Barcelona ou da Catalunha, região onde fica a cidade de Barcelona? Então te fode porque não vou te explicar. Tu só tem que saber o seguinte: a Catalunha é a região mais rica da Espanha; sofreu inúmeras represálias durante a ditadura do General Franco, entre 1939 e 1975; grande parte do seus habitantes defendem a independência; e o Barcelona é o maior símbolo desta luta.

Em 2010, uma pesquisa realizada pela empresa alemã Sport+Markt concluiu que a torcida do Barcelona é a maior da Europa, contando com cerca de 57,8 milhões de pessoas. Muitos deles motivados pela história libertária do clube, ou por compartilhar das ideias de independência dos seus diretores e mais fiéis torcedores, quem sabe por entenderem que uma das poucas resistências a ditadura espanhola acontecia nos jogos do clube - no Camp Nou às vozes contra Franco não podiam ser silenciadas.

Em todos os jogos do time em casa, exatamente aos 17 minutos e 14 segundos do jogo, os torcedores presentes cantam em coro para pedir a separação da Catalunha. O horário faz referência ao ano de 1714, quando um levante catalão foi sufocado pela monarquia na Espanha. 

Mas tudo isso está acabando. Os simpatizantes do Barcelona cresceram muito nos últimos quatro anos – sua marca é uma das mais conhecidas do planeta. O General Ustra no seu depoimento na Comissão da Verdade estampava uma camiseta com o símbolo da Catalunha livre. Fascistas nórdicos, que apoiaram a Croácia na Guerra Civil da antiga Iugoslávia, são sócios do clube e fundaram uma torcida anti Real Madrid em Oslo, Estocolmo e Copenhague. 

Fundamentalistas sauditas, sírios e iranianos gastam milhões só para acompanhar seus treinos de pré-temporada no Catar ou nos Emirados Árabes Unidos. Empresários liberais norte-americanos investem no soccer só para ter o prazer de ver o Barça jogar uma partida oficial em seu território.
Mas nenhum deles conhece a história do Barcelona ou da Catalunha, eles torcem para o time do Messi. É fato: a história milenar da Catalunha e a centenária do Barcelona se esfarelam quando o baixinho argentino entra em campo. 

Bilhões de pessoas acompanham os jogos do time do menino de Rosário via TV ou internet apenas esperando seus gols. Se o Barcelona ganhar: melhor. Porém, ninguém está interessado no resultado, estão apenas interessado em saber quantos gols o Messi anotou. 

Eu mesmo sou um fanático por futebol. Sei até a escalação do Bangu Atlético Clube de cor (Getúlio, Celsonill, Raphael, Carlos e Renan; Gabrie, Mayaro, Marcos e Gilmar; Sérgio e Hugo). Entretanto, não sei um nome sequer do time do Barcelona. Fora o do Messi, óbvio. 

Parece que têm dois brasileiros nas laterais. Um zagueiro que divide seu coração entre atacantes suecos e dançarinas colombianas. Um outro zagueiro crespo e mal encarado. No meio impera uns baixinhos carecas (todos poderiam ser meus irmãos) e dois magrelos com cara de estudantes secundaristas ativistas da UNE. Na frente, um chileno (não sei se é o Marcelo Salas ou o Ivan Zamorano), um cara com nome de apóstolo e outro de herói bíblico.

Aqui em casa é um bom exemplo. Nunca torci para o time do Barcelona até o surgimento do argentino. Na Espanha meu time predileto era o Albacete. Como não tenho televisão acompanho todos os jogos via internet através de Live Scores. Quando sai um gol do Barcelona já entro no jogo ansioso, mal consigo respirar, pra descobrir o autor. Se o tento é do Messi, a felicidade toma conta. Abro uma ceva. Arranco a roupa da minha namorada e a gente faz quatro minutos maravilhosos dos mais puros sexo selvagem. 

Se o Messi anotar vários gols (tipo três ou quatro), como acontece periodicamente, aí vira putaria. Tomo logo uma caixa de cerveja e o sexo com a minha namorada dura sete minutos – sem parada pra descanso. 

Agora se o Barcelona joga e não tem gol do Messi, como ontem na vitória sem graça sobre o Alético de Madrid, tomo, no máximo, um copo de leite da marca Bom Gosto e a cena mais sexual que me vem a mente é uma bela partida de canastra entre a rainha Elisabeth e a Madre Teresa de Calcutá. 

Na real, só escrevi esses quatro mil e quarenta e seis caracteres com espaço para tentar dizer o óbvio. Se o Barcelona quiser continuar a ser Mais que um Clube tem que vender, doar, se desfazer, do argentino urgentemente. Porque corre o risco de ter toda a sua história resumida a uma frase: Barcelona, o time onde o Messi jogou. 


* Publicado hoje, no errandoacavada.blogspot.com.br. Cristian é jornalista, gremista e botonista. Nasceu em Alegrete, passou a adolescência em Rio Grande e desfruta sua velhice na Cidade Baixa, em Porto Alegre.

2 comentários:

  1. Texto sensacional.
    A única "liberdade" que o Ustra defende é a do "pau-de-arara", a "pimentinha", e os "caldos".

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  2. O pau de arara do acordo ortográfico perdeu o hífen, mas o da ditadura continua pendurando a consciência do país.

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