segunda-feira, 30 de janeiro de 2012
À nossa direita... (por Luiz Carlos Vaz*)
Os domingos à noite em Bagé
nunca mais foram os mesmos depois que a televisão passou a transmitir as lutas
do Ringuedoze Liquigás, da TV Gaúcha, Canal 12 de Porto Alegre. Várias lutas
que, necessariamente acabavam no terceiro “assalto”, movimentavam as famílias e
dividiam os espectadores nas preferências e nas torcidas. Havia os bons moços,
como Scaramouche, Marco Polo, Ted Boy Marino, Leão do Líbano; os feios, sujos e
malvados como El Duende, Barba Roxa, Stiner e os misteriosos estilo Fantomas,
Verdugo, Leopardo, que eram os que usavam máscaras. Marcos Martins, do Portal da
Luta Livre, diz que Fantomas foi uma personagem criada pelo empresário da TV
Globo do Rio, Teti Alfonso, em 1966. Por ser mascarado podia ser “interpretado”
por vários lutadores. Martins, no mesmo relato, afirma que o primeiro Fantomas
foi encarnado pelos argentinos Ali Bunani e depois por El Toro. O brasileiro
Luizão, entre outros, também teve seus dias de Fantomas.
A verdade é que, na
segunda feira de manhã, não se falava em outra coisa no recreio do Colégio
Estadual de Bagé. O apresentador oficial era o conhecidíssimo radialista Éldio
Macedo que era anunciado por uma voz off como o “marronzinho mais elegante de
Porto Alegre”. Ele subia ao ringue e anunciava:
_ “À nossa direita, lutador
com 98 quilos, a fera argentina... Elllll Dueeende; à nossa esquerda, lutador
com 105 quilos, o misterioso Veeeerdugo; e, para comandar esta fantástica luta,
o mediador Ciiiiiiiiigano”.
E lá vinham as sequências de draps, tesouras,
torções, voadoras.... Os “malvados” seguidamente proporcionavam cenas circenses
como esfregar uma metade de limão nos olhos do adversário, açoitar o oponente
com um chicote trazido às escondidas dentro do calção... o mediador, para
desespero da plateia, nada via, e tudo era uma festa e a luta sempre acabava no
terceiro assalto.
Um belo dia o Ringuedoze Liquigás que, já perdendo o gás,
mudara de nome e agora era patrocinado pelo Marinha Magazine, apresentou-se em
Bagé, numa improvisada estrutura montada no campo do Guarany Futebol Clube. Quem
foi o primeiro a entrar? Eu, é claro.
Foi uma decepção! Ao vivo tudo ficava
mais claro. Era uma “baita marmelada”. Nós, a gurizada de Bagé, não tínhamos
como entender que era apenas um teatro, o desempenho de uma profissão, que
aqueles lutadores eram, na verdade, lutadores de espetáculo. Ali, no ringue
improvisado no campo do Guarany, e olhando bem de perto, percebíamos que os
socos não eram assim tão fortes, que as voadoras eram ensaiadas e que vencer no
terceiro assalto era uma questão de sequência de atos da programação, um
imperativo do seguimento publicitário. Eles eram apenas artistas, trabalhadores
como nossos pais. Precisavam apenas garantir o anabolizante das crianças.
Brigavam, se desentendiam, eram inimigos de morte, queriam bater, ver o sangue
do adversário, esganar, matar... mas somente ali, no ringue. Fora dele, eram
colegas de profissão, de viagem, de trabalho. Se existisse na época essa tal
pizza de hoje, ela seria o prato ideal para saborear juntos, depois das lutas.
Nunca mais assisti ao Ringuedoze Liquigás - ou Marinha Magazine - com o
mesmo interesse. Eu não queria ver ninguém quebrado, é claro, mas bem que o meu
ídolo – o Leopardo - poderia ter dado uma boa sova no El Duende, naquela noite
lá no campo do Guarany, nem que fosse só para justificar a fotografia que o
Marinha Magazine enviou para mim – o seu fã número um.
* O Vaz, fraterno amigo e fiel escudeiro de meu pai, me mandou este texto que foi por ele publicado em 20 de março de 2010 no velhaguardacarloskluwe.blogspot.com, blog irmão mais velho deste BF. Apesar de já nos ter brindado com a foto da "jangada nipo-canguçuense", ficou, agora, devendo-nos o raríssimo "retrato" do Leopardo (que vai aqui substituído pela "imagem de divulgação" da TV Gaúcha, obtida em um Caderno de Cultura da ZH).
domingo, 29 de janeiro de 2012
Oropa, França e Bahia
Almoço em alto estilo (Marina Oliveira, no DP de sábado)
Foi na estância Capão Redondo que a famosa decoradora Rosa May Sampaio recebeu para o almoço informal os antiquários Ricardo Magalhães e Sergio Bonini acompanhados de Thales Moura de Assis. Camarão da lagoa e saladas variadas foram os pratos de resistência que resultaram muitos elogios para a cozinheira da estância. No vai-e-vem o garoto Luis Eduardo Magalhães Guinle, neto da anfitriã, que, para quem não sabe, conto: é bisneto de dona Antoninha Sampaio e do famoso político baiano Antônio Carlos Magalhães. Antoninha também acompanhava o grupo. Entre os assuntos, os festejos do seu aniversário, dia 27 de fevereiro, mas que será comemorado dia 25.
Após os petit furs, descontraídos, os presentes apreciaram o lombinho |
Pelo que o BF apurou (em off, course) a respeito do noticiado no vetusto informativo pelotense, tornou-se famosa a sinhazinha que recebeu os convivas para o almoço em razão de seu principal feito: ter decorado a tabuada todinha (menos o 8 vezes 8, que é muito difícil). Da mesma forma soube-se que, após deliciarem-se com os camarões, os decoradores presentes na estância não se fizeram de rogados, tratando de mostrar como se faz o vai-e-vem ao petiz Lulu (futuro Capitão-Geral da Bahia). Quanto ao festerê do próximo dia 25, assombra os corações e mentes da gentil sociedade pelotense a cruel dúvida: Nabuco virá ou na bunada não vai dinha?
sexta-feira, 27 de janeiro de 2012
Tche-tchererê...
Nesta entressafra de fatos interessantes, que valham a pena ser comentados, o Bipolar Flexível encontra-se - como facilmente podem verificar os fieis (e até os infiéis) leitores - sem muito assunto. O Big Brother, por exemplo, já foi "debatido" nas famigeradas redes sociais à saciedade; a Globo que o defenda da sanha neo-moralista que clama pela esconjuração do reality, tido por ofensivo à "família brasileira", à Liga da Senhoras Católicas. Embora engraçada, a sanha da "grávida de Taubaté" também já se esgotou nela mesma. Somente a famosa Velhinha da pacata cidade paulista em repentina evidência poderia acreditar que sob o fuleiro vestido da tal mulher havia mesmo quadrigêmeos. Ah, e essa foi a principal notícia até... até a materialização da tal Luísa, aquela que estava no Canadá.
No meio dessa pobreza toda, durante estas modorrentas férias de janeiro, o Brasil todo se voltou à nova paixão nacional: o MMA, confronto entre quasímodos bombados, com orelhas de couve-flor e cérebros de purê, sempre agradecendo ao "King of the Kings", se demolindo dentro de um "octógono", para delírio de uma plateia composta por quasímodos bombados, com orelhas de couve-flor e tatuados com passagens bíblicas e carinhas da Hello Kitty.
Já era o "Padrão Globo de Qualidade"! Viramos um grande "Programa do Ratinho"!
Estamos bregas! Eu, Michel Teló, Gustavo Lima e você!
Perdemos, playboy (por Flavio Gomes*)
Os mais astutos devem ter notado hoje que Galvão Bueno não narrou o treino de classificação de Abu Dhabi, e nem vai narrar a corrida de amanhã pela Globo. Não é a primeira vez, claro. Isso já aconteceu muitas vezes quando o locutor oficial foi escalado para algum outro evento importante, como jogos da seleção brasileira, finais de Copa do Mundo, competições em Olimpíadas, talvez nos Jogos Pan-americanos do Rio de 2007.
Mas, hoje, não. Hoje, não é futebol, Olimpíada, vôlei. Galvão vai narrar uma luta de MMA. Ou UFC. Não sei direito. E, por isso, está fora da F-1 no fim de semana.
Isso tem enorme significado. Considerações sobre Galvão à parte — há os que gostam, os que não gostam, os que não suportam, os que amam, isso não importa —, a escalação do principal narrador da maior emissora de TV do país para fazer uma luta em vez de uma corrida significa que a F-1 morreu.
Isso mesmo, camaradas: morreu. A Globo é pautada pela babaquice geral das cabeças que se acham pensantes em sua direção. Algum gênio, em algum dia no passado, decretou que esporte bom é esporte que tem brasileiro ganhando. Graças a tal dogma estabelecido, imutável, pétreo, ganhamos, nas manhãs de domingo, campeonatos mundiais de futebol de areia, torneios interplanetários de peteca na praia, desafios internacionais de futebol de salão, competições de natação em rios amazônicos e provas de pedestrianismo em Belo Horizonte criados e elaborados com um único objetivo: para que atletas e/ou times brasileiros vençam, para que a vinhetinha Brasil-sil-sil possa ser executada à exaustão, para que a patuleia, por volta do meio-dia, se sinta a mais vitoriosa do planeta e possa mandar servir o espaguete e abrir a brahma.
Ayrton Senna se prestou muito bem a esse papel durante anos, e não é por acaso que a Globo sempre o amou de paixão. Mas morreu, e os que vieram depois dele não conseguiram grande coisa. Daí o nascimento dessas patetadas que durante algum tempo foram chamados até de Jogos Mundiais de Verão.
Massa esboçou alegrar nossas manhãs de domingo Brasil-sil-sil em 2008, mas já ficou claro que não é ele o cara, assim como não foi Barrichello e, lamento, Bruno pode carregar o sobrenome, o capacete e o preto e o dourado, mas será no máximo um piloto para compor grid durante algum tempo, enquanto houver quem o patrocine e quem lhe ofereça um carro.
Daí que a Globo elegeu a nova paixão brasileira, trocando apenas as manhãs de domingo pelas noites de sábado, e essa nova paixão — agradeçamos nossos guias! — é esta merda de luta livre, essa pancadaria desenfreada que estimula a molecada a lutar jiu-jítsu e sair pelas ruas espancando gays, pobres, negros, nordestinos, tudo revestido com um ar profissional e chique, feérico, luminoso, “ultimate”, “fighting”, palavras em inglês, combates em ginásios, gente de smoking na plateia, uma releitura cafona e caricata do que foi o boxe em algum lugar do passado, boxe devidamente morto e enterrado pelo MMA, uma sigla que significa algo como artes marciais múltiplas, sei lá se é isso. Arte é o cacete, briga não é arte, assim como o boxe nunca foi a “nobre arte”, como diziam os antigos, embora, diante desse vale-tudo de cotoveladas e chutes na cara, o boxe pareça mesmo uma arte — praticada, diga-se, por personagens muito, mas muito mais interessantes que esses tontos que se fingem de inteligentes e lutam num negócio chamado octógono.
Galvão vai narrar a luta de UFC hoje (ou luta de MMA? Afinal, qual é o esporte, UFC ou MMA? Puta bosta, isso), fará elogios rasgados à modalidade, ao seu crescimento, à sua popularidade, ao dinheiro que movimenta, ao profissionalismo, à idolatria pelos lutadores, aos incríveis brasileiros que dominam o octógono e nem podem andar na rua sem dar autógrafos, que são celebridades, que são demais, Brasil-sil-sil, salve a família Gracie, e a luta vai estar nas TVs dos bares e dos lares, e os melhores momentos estarão no “Fantástico” e no “Jornal Nacional”, além de todos os programas de esportes da emissora que falam dessa luta há dias, e vamos virar a pátria do MMA e do UFC, como se já não houvesse violência bastante por aí para dispensar porradas na cara, dentes quebrados, sangue jorrando, gente urrando em horário nobre, para milhões, milhões de telespectadores retardados que acham legal tudo que a Globo coloca no ar.
Não sei nem quem vai lutar. Minotauro? Touro Sentado? Fantomas? O Poderoso Hulk? Ted Boy Marino? Electra? Aquiles, o Matador? Barba Negra? Verdugo? Múmia? Tigre Paraguaio?
Minotauro, vá lá. Faz algum sentido. Mas os lutadores agora têm nome e sobrenome e são levados a sério.
Até nisso o telecatch era melhor. Ninguém levava porra nenhuma a sério.
O mundo acabou, bebê.
Ferro na boneca! |
* Esta absolutamente lúcida crônica do Flavio Gomes foi publicada no blog flaviogomes.warmup.com.br em novembro do ano passado. Conforme está lá no blog, o autor "é jornalista, dublê de piloto e escritor. E professor de Jornalismo na FAAP, também. Por atuar em jornais, revistas, rádio, TV e internet, se encaixa no perfil do que se convencionou chamar de multimídia. “Um multimídia de araque”, diz ele. “Porque no fundo eu faço a mesma coisa em todo lugar: falo e escrevo.” Sua carreira começou em 1982 no extinto jornal esportivo “Popular da Tarde”. Passou pela “Folha de S.Paulo”, revista “Placar”, rádios Cultura, USP, Jovem Pan e Bandeirantes. Foi colunista e repórter do “Lance!” de 1997 a 2010. Hoje cobre Fórmula 1 para 12 jornais brasileiros através de sua agência Warm Up. É também comentarista, apresentador e repórter da ESPN Brasil e da rádio Estadão ESPN. Está no iG, com o site “Grande Prêmio”, desde a criação do portal, no final de 1999. Em 2005, publicou “O Boto do Reno” pela editora LetraDelta. Desde 1992, escreve o anuário "AutoMotor Esporte", editado pelo global Reginaldo Leme. É torcedor da Portuguesa, daqueles de arquibancada, e quando fala de carros começa sempre por sua verdadeira paixão: os DKWs e Volkswagens de sua pequena coleção. É com eles que roda pelas ruas de São Paulo. Nas pistas, pilotou de 2003 a 2007 o intrépido DKW #96, que tem até fã-clube (o carro, não o piloto). Por fim, tem uma estranha obsessão por veículos soviéticos. “A Lada foi a melhor marca que já passou pelo Brasil”, garante. Por isso, trocou, nas pistas, o DKW por um Laika batizado pelos blogueiros de "Meianov"."
Ajeitando a sintonia fina
O grande Verdugo, pronto para aplicar uma "cutelada", sua especialidade |
Lendo as ótimas crônicas do Luis Fernando Veríssimo e do Flavio Gomes, num acesso de nostalgia vieram-me à cabeça velhas recordações de uma época em que eu era bem criança, lá dos anos 60, início dos 70. Na televisão Hotpoint, imagem em preto e branco, passava o Telecatch Run Montilla, que mais tarde foi substituído aqui no sul pelo Ringue 12 Marinha Magazine (transmitido ao vivo desde o Ginásio da Brigada Militar, em Porto Alegre, e cujo apresentador, Éldio Macedo, era denominado "o marronzinho mais elegante do Brasil").
Engraçado que nunca se suspeitou (pelo menos eu e meu irmão!) que o que se via na telinha chuviscada era "marmelada". Contrariando a maioria, sempre torcemos para os "bandidos" (da mesma forma que fazíamos à tarde, na expectativa de que algum dia o Dick Vigarista vencesse na Corrida Maluca). Mas nunca testemunhamos uma vitória do Mamute, do Verdugo, do Mongol, por exemplo, contra o Ted Boy, o Caruso ou o Tigre Paraguaio. E isso que durante todos os combates nossos preferidos costumavam judiar dos mocinhos até que, inexplicavelmente, os "galãs" arranjavam sabe-lá-de-onde um último gás e decidiam a luta a favor deles.
"Draps", "voadoras", "tesouras", "cutelaços", "double-nelsons" eram os nomes dos golpes mais utilizados pelos lutadores mambembes e os confrontos mais aguardados eram as "australianas", lutas em que participavam mais de dois lutadores, em duplas ou, até, quartetos, simultaneamente, sempre respeitada - evidentemente - a indispensável divisão maniqueísta "do bem" versus "do mal".
Saudades do Ted Boy Marino (por L. F. Veríssimo*)
Alguma coisa aconteceu no coração do Brasil quando acabaram com as lutas de "catch". Elas eram um sucesso na TV e seus astros viajavam em caravanas pelo país, apresentando-se em ginásios e circos. As lutas não eram lutas, eram teatro. Não eram exatamente combinadas, mas seguiam um roteiro estabelecido e havia um acordo tácito de que ninguém sairia do ringue machucado, mesmo que saísse arremessado.
O roteiro básico não variava: eram os bons contra os maus, e os bons sempre ganhavam. Ou só perdiam quando o adversário traiçoeiro recorria a um golpe especialmente baixo, sob uivos de raiva da plateia. E a reação da plateia fazia a parte do teatro. Havia uma suspensão voluntária de descrença, e todos torciam pelo Bem contra o Mal - ou pelo bonito contra o feio, o esbelto contra o barrigudo, o correto contra o falso - com um fervor que não excluía a consciência de que era tudo encenação.
Era fácil distinguir os bons e os maus. Os bons eram atletas como o Ted Boy Marino, caráter tão irretocável quanto os seus cabelos loiros, que lutava limpo. Os maus tinham nomes como Verdugo e Rasputim, e comportamento correspondente ao nome. Lembro de um Homem Montanha, que de uma vez derrubou o juiz junto com o adversário. E não havia um Tigre Paraguaio?
Os bons geralmente começavam apanhando e, quando parecia que estavam liquidados e que o Mal triunfaria, vinha a eletrizante reação, durante a qual o inimigo pagava por todas as suas maldades. Humilhação e vingança, nada na história do teatro é tão antigo e tão eficaz. Nove entre 10 novelas de TV têm o mesmo enredo.
Não sei se ainda fazem espetáculos de "catch" pelo interior do país. hoje, na TV, o que se vê é o "ultimate fighting", ou "mixed martial arts", dois lutadores simbolizando nada trocando socos e pontapés sem simulação, quando não se engalfinham no chão como um bicho de duas costas e oito patas em convulsão. Nessas lutas não vale, exatamente, tudo - parece que esgoelar o outro e xingar a mãe não pode. mas é o "catch" despido da fantasia, com sangue de verdade. Não há mais mocinho e vilão, apenas duas máquinas de brigar, brigando. Nem Ted Boy Marino nem Homem Montanha, apenas a violência em estado puro. Sei não, acho que empobrecemos.
* Esta crônica do Luis Fernando Veríssimo foi publicada na Zero Hora de ontem. É, assim, ao contrário de inúmeras outras que têm sido "compartilhadas" no facebook, autêntica.
Rasputin demolindo o grande Ted Boy Marino. O Barba Ruiva não sabia (sabia sim!) o que lhe aguardava! |
quinta-feira, 26 de janeiro de 2012
Deu no veterano DP
Posando no "redondo" - foto do DP |
"Em clima de harmonia, nove candidatas disputam o título para a Corte Gay do
Carnaval de Pelotas com o grande objetivo de brilhar na grande festa e
representar uma parte da sociedade que ainda sofre muito com o preconceito: os
travestis. Nestes quatro anos desde a criação da primeira Corte, o grupo já soma
inúmeras conquistas como a de ser oficializado na grande festa e ter os mesmos
direitos da Corte hétero.
Apesar de comemorarem o espaço obtido na
grande folia da cidade, agora as candidatas lutam por uma unificação da Corte do
Carnaval. “Por que haver corte gay e corte hétero? Esta divisão já é um
preconceito, deveria ser tudo uma coisa só: a Corte do Carnaval de Pelotas”, diz
o presidente da Associação GLBT de Pelotas, Ricardo Santos. A organização do
concurso afirma que a divisão faz com que o trio hétero seja convidado para
alguns eventos e o gay não, muitas vezes por falta de informação, já que nem
todos os municípios sabem da existência das duas Cortes na Princesa do Sul."
Fosse ainda vivo,
Seu Machado (
meu velho guru machista e politicamente incorreto), certamente teceria o seguinte comentário a respeito dessa matéria do Diário Popular:
"E em Rio Grande o porto cheio de navios precisando ser descarregados..."
domingo, 22 de janeiro de 2012
Deixando as "flardas"*
Um ano de Bipolar Flexível! No verão do ano passado, por insistência da Flor, acabei criando (com "consultoria técnica" e layout dela) este blog. No início, meio lento (nem publicar fotos eu sabia direito!), custei a engrenar, pegar o jeito da coisa, o timing das postagens (é difícil evitar a chatice, a repetição). Depois, peguei o gosto e (acho) um certo estilo apropriado ao meio.
Muito bacana constatar que, nestes doze meses, o BF teve quase 30 mil acessos. Não sei bem se me dá mais alegria o fato do blog ter permitido que fizesse contato com gente de tudo quanto é lugar - com opiniões e interesses convergentes ou divergentes dos meus - ou o de proporcionar a proximidade (ainda que virtual) com pessoas próximas que estavam distantes. Confesso que meu maior prazer nem é publicar textos e fotos no blog; é, na verdade, receber contribuições para novas postagens e, mais que tudo, comentários a respeito das publicações.
Então, comemorando este primeiro aniversário, cabe agradecer a quem se deu ao trabalho de ler e, às vezes, ver e ouvir o que aqui foi publicado. Primeiro, aos mais de casa (Nanda, Flor, pai) - responsáveis pelas críticas imediatas -; depois, para os fieis seguidores e aos que, ainda que secretamente, gostam (ou odeiam!) o Bipolar.
*pronúncia jaguarense
sexta-feira, 20 de janeiro de 2012
Amanhã, 1 ano de BF!
quinta-feira, 19 de janeiro de 2012
quarta-feira, 11 de janeiro de 2012
Herança maldita
A Pedra da Lua
Nixon deu a Médici.
O mimo está em Bagé.
Nixon e Médici
(carregando outras pedras),
no quinto dos infernos.
A Invenção da Mentira
Hoje, na madrugada, assisti a um filme maravilhoso: O Primeiro Mentiroso (The Invention of Lying). Depois, mais de 3 horas, galo querendo cantar, tevê e luzes desligadas e eu lá, pensando sobre o que assistira. Agora, procurando a respeito desse filme na Internet, acabei achando um texto muitíssimo bom, de autoria de Wilson Roberto Vieira Ferreira, no cinegnose.blogspot.com. Apesar de longo, resolvi postar no BF esse texto (que substitui com sobras qualquer coisa que um pretendesse redigir sobre o filme que vi e que, recomendo, seja visto e "pensado" por todos).
Uma Fábula Sobre mentira e Religião
Embora seja enquadrado dentro do gênero “comédia romântica”, "O Primeiro Mentiroso" (The Invention of Lying, 2009) é o resultado de um poderoso roteiro carregado de humor negro sobre os temas da mentira, amoralidade e religião. Diferente dos parâmetros hollywoodianos, a mentira não é tratada pelo viés moral. O filme é uma corrosiva fábula sobre um mundo incapaz de mentir não por livre-arbítrio, mas por amoralidade.
No cinema hollywoodiano o tema da mentira sempre foi tratado dentro do campo da moral: a verdade e a honestidade são vistas como virtudes que, no final, sempre acabam se impondo à mentira. Por exemplo, filmes como os do diretor Frank Capra dos anos 30 e 40 onde os heróis virtuosos lutam para que a verdade se imponha à corrupção e a mentira; comédias como “Muito Louco” ("Crazy People", 1990), estrelado por Dudley Moore sobre a mentira e a honestidade em publicidade; e “O Mentiroso” ("Liar, Liar", 1997) onde Jim Carrey faz um advogado que mente compulsivamente até que, graças ao desejo do seu filho no seu aniversário, é condenado a dizer sempre a verdade, metendo-se em mil enrascadas na profissão para provar que a verdade é a melhor política.
A novidade do filme “O Primeiro Mentiroso” é que ele inverte a questão ao colocar a mentira no campo da amoralidade. O filme é uma fábula onde em um mundo onde todos falam a verdade não existe o conceito de mentira. “Franqueza”, “honestidade” e “sinceridade” não são bem os termos que possam ser aplicados aos habitantes desse universo fictício. Essas são categorias morais. O problema dos habitantes dessa fábula é que eles são amorais: simplesmente dizem o que lhes vem à mente sem saberem a oposição entre verdade/mentira, moral/imoral. Eles se comportam assim não por uma opção moral (livre arbítrio na escolha entre o certo e o errado). O interessante no filme é que, nesse mundo paralelo, as pessoas assim se comportam por serem seres amorais.
Os diálogos diretos criam situações de típico humor negro chegando próximo ao brutal. Como na sequência em que o protagonista Mark (Ricky Gervais) chega a casa de Anna (Jennifer Garner) para o primeiro encontro. Ela atende a porta e se desculpa pelo atraso, e fala para Mark que estava se masturbando porque acreditava que aquele encontro seria um fracasso!
Mark é um perdedor nato que trabalha como roteirista para o cinema (não há ficção em um mundo onde não se pode mentir, por isso os filmes são basicamente textos sobre fatos históricos reais lidos por um narrador em tom professoral diante das câmeras). Mark se interessa por Anna, mas em virtude de ser “gordinho com nariz arrebitado” e fracassado financeiramente torna o romance impossível.
As pessoas nesse mundo são tão diretas e verdadeiras que expressam sem pudor seus preconceitos e intolerâncias. Anna até gosta de Mark, mas preocupa-se com sua herança genética. Esse mundo é cruelmente dividido entre vencedores e perdedores (genética e financeiramente falando).
O fracasso financeiro de Mark chega ao limite no momento em que ele é demitido do estúdio de cinema e está prestes a ser despejado de sua casa. Deve 800 dólares de aluguel e só tem 300 na sua conta. Ao chegar ao banco para sacar tudo o que resta é informado pela caixa que o sistema caiu. Ela lhe pergunta quanto tem na conta. Uma ideia vem como um raio à mente de Mark: e se mentisse! Ele diz que tem 800 dólares e a caixa acredita. Com isso evita ser despejado de sua casa.
Tal como Adão no Paraíso do Gênesis bíblico, Mark morde a maçã, perde a inocência e descobre os prazeres da mentira. A grande sacada do filme é que, ao contrário do moralismo bíblico hollywoodiano, Mark não será punido. Mais que isso, como primeiro mentiroso da história daquele mundo paralelo, será capaz até de criar a primeira religião baseada na mentira.
Religião como racionalização
O argumento do roteiro escrito por Ricky Gervais é instigante ao concordar com a máxima do escritor e poeta irlandês Oscar Wilde: “todo realismo é triste”. O fato de as pessoas serem incapazes de entender o conceito de mentira (é impagável a sequência em que Mark tenta explicar aos amigos como ele mentiu no banco – ninguém entende nada!) não torna o mundo melhor. Todos parecem ser tristes, enfadados, aborrecidos em um mundo onde o império da verdade somente fez dividir o mundo entre vencedores e perdedores, pessoas com herança genética “perfeita” e “imperfeita” (em outros termos, eugenia e preconceito) e onde crianças gordinhas são vítimas de bullying por parte de crianças “vencedoras”.
Apesar da verdade, não há a Verdade. Tudo é amoral e sem sentido. Até o momento em que, sem querer, Mark cria a segunda invenção que vai complementar a mentira: a racionalização.
No leito de morte da mãe no hospital, vendo o desespero dela diante da morte (para onde vamos, para o nada?) Mark mente ao dizer que ela vai para um paraíso maravilhoso, onde todos tem uma mansão e lá encontrará seus entes queridos. Os médicos ouvem e espalham a notícia. Logo dezenas de repórteres estão atrás dele para que explique melhor o que há depois da morte. Cria-se uma comoção mundial e centenas de pessoas param a sua porta à espera de uma resposta de Mark.
Continuando a mentira, Mark criará, (tal qual Moisés no Velho testamento bíblico onde, após uma conversa com Deus, desceu das montanhas com as tábuas dos dez mandamentos) os mandamentos de uma nova religião, mostrada para todos gravados não em tábuas de pedra, mas em caixas de Pizza Hut. Mark criar as bases de uma nova religião baseada na imaginação onde Deus é o responsável por tudo de bom ou de ruim que acontece na vida de todos.
Se a até então a realidade era triste e sem sentido, a partir da revelação de Mark tudo passa a fazer sentido (Hilário! Mark é homenageado com a sua imagem em vitrais de igrejas, segurando as tábuas dos mandamentos em caixas de Pizza Hut).
Isso faz lembrar o conceito de racionalização tal como descrito por Freud. Para ele aRacionalização é o processo de achar motivos lógicos e racionais aceitáveis para pensamentos e ações. É o processo através do qual uma pessoa apresenta uma explicação que é logicamente consistente ou eticamente aceitável para uma atitude, ação, ideia ou sentimento que causa angústia. É uma forma para justificar comportamentos quando, na realidade, as razões para esses atos não são recomendáveis.
Se por um lado a nova religião do “homem do céu” de Mark dá um sentido e alento para o cotidiano, por outro lado acaba servindo de justificativa para todos os preconceitos e intolerâncias resultantes da “franqueza” de todos. Tudo será explicado como se assim “o homem do céu” quisesse. “Vencedores”, “perdedores” e pessoas “geneticamente imperfeitas” são, assim, vistas como um desígnio divino.
Um melancólico humor negro
A fábula proposta por Ricky Gervais é triste e melancólica, dentro de uma narrativa de hilariante humor negro. Gervais chegou ao mainstream com o sucesso da sua série televisava “The Office” na inglaterra, co-escrita e co-dirigida com Stephen Merchant e ainda atuando como o protagonista David Brent . Em Hollywood estrelou como protagonista em filme como “Ghost Town” e esse “O Primeiro Mentiroso”.
É claro que, como filme hollywoodiano, “O Primeiro Mentiroso” é enquadrado dentro do gênero “comédia romântica”. Provavelmente os produtores do filme forçaram para que o roteiro focasse mais na estória romântica do amor impossível entre Anna e Mark, para suavizar o impactante humor negro crítico de Gervais (por conta disso, o roteiro perde muito sua força na segunda metade do filme).
Mas os elementos desafiadoramente críticos permaneceram: a amoralidade, a religião como instituição racionalizadora e a não-punição do protagonista, mesmo após ter comido a maçã do pecado da mentira.
Ele continua mentindo compulsivamente até o final. Talvez, o próximo estágio de Mark seria quando ele passasse a acreditar nas próprias mentiras, esquecendo-se o que fora, um dia, a verdade. Bem, aí estaríamos dentro do campo da amoralidade pós-moderna.
Ficha Técnica
- Título: O Primeiro Mentiroso (The Invention of Lying)
- Direção: Ricky Gervais e Matthew Robinson
- Roteiro: Ricky Gervais e Matthew Robinson
- Elenco: Ricky Vervais, Jennifer Garner, Rob Lowe, Jonah Hill, Jeffrey Tambor
- Produção: Warner Bro. Pictures, Radar Pictures
- Distribuição: Universal Home Entertainment
- País: EUA
- Ano: 2009
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